
Foto/Divulgação: Thiago Lontra
O presidente da Comissão para Acompanhar o Cumprimento das Leis (Cumpra-se), da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), deputado Carlos Minc (PSB), afirmou que pretende incluir no Projeto de Lei 2.675/23, que cria procedimentos para disponibilização do prontuário ao paciente, um artigo para prever punição em caso de manipulação desse tipo de documento. A iniciativa surgiu a partir de relatos de mães que sofreram violência obstétrica, apresentados em audiência pública do Parlamento, nesta terça-feira (18/06).
Segundo as vítimas, os hospitais criam burocracias para atrasar a entrega desse documento, causando a desistência daqueles que procuram o acesso a esse direito. Foi o que aconteceu com a família da jovem Taysa da Silva, de 22 anos, que morreu após dar à luz em um hospital de Itaboraí e teve seu prontuário retido na unidade de saúde. Minc declarou que o PL será atualizado para evitar casos como esse e punir estabelecimentos médicos que manipulem o relato dos procedimentos para esconder irregularidades.
“Vamos incluir a obrigação dos hospitais e maternidades colocarem no prontuário as anotações originais da equipe. Muitas vezes elas são revistas e editadas em uma versão final e manter as observações dos médicos e enfermeiros pode evitar que, no ato de unir todas as informações, questões problemáticas sejam omitidas”, explicou o parlamentar. Ele disse que, se aprovada, a norma se chamará “Lei Taysa”, em homenagem à família da jovem que lutou para ter acesso ao seu prontuário.
Prazo para a entrega do prontuário
O acesso ao documento é um direito de todos garantido pela Lei 3.613/01, criada e aprovada pela Alerj. De acordo com Minc, as mulheres que dão à luz no Estado do Rio enfrentam resistência ao cumprimento da medida. Por isso, o deputado estabeleceu no PL 2.675/23 procedimentos mais objetivos para a entrega do prontuário, como prazo de até cinco dias corridos e a disponibilização, logo após a alta médica, de um mini prontuário com informações sobre os procedimentos usados no atendimento.
Segundo a advogada Pamela Brito, que é membro da OAB Mulher, da Ordem dos Advogados do Rio, o mini prontuário é importante para diminuir as chances de manipulação no documento final. Ela destacou que a Resolução 1.638/02, do Conselho Federal de Medicina (CFM), orienta que as unidades de saúde tenham uma Comissão de Revisão de Prontuários. “Estamos pedindo para que a Justiça revise as práticas que são adotadas nessas comissões”, contou.
Representando a coordenação de Saúde da Mulher, da Secretaria de Estado de Saúde, Renata Alves afirmou que os prontuários podem demorar para chegar às mãos das pacientes por uma questão de segurança nos procedimentos internos das unidades de saúde: “A burocracia é necessária porque o prontuário não pode ser perdido. Ele percorre alguns setores, o que deve ser feito com cautela. Esses procedimentos têm que existir por questões de organização, mas é claro que entendemos que isso não pode impedir o acesso a esse documento”. Ela destacou que o Executivo está buscando promover qualificações nas equipes médicas para melhorar o atendimento à mulher na rede pública.
Parto humanizado
A coordenadora da pesquisa Nascer no Brasil, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Silvana Granado, explicou que as mulheres brasileiras enfrentam diversas violências obstétricas, como a realização de cesáreas sem consentimento. Um dos indicadores que apontam a baixa incidência de partos humanizados no país, segundo ela, é a falta de suporte de profissionais especializados nesse tipo de atendimento. “Nossa pesquisa aponta que, no Estado do Rio, apenas 0,4% dos partos aconteceram com doulas. Elas ainda precisam ocupar esse espaço de forma mais ampla”, disse.
Presidente da Associação de Doulas do Estado do Rio (ADoulas/RJ), Gabriela Santoro sugeriu que as doulas sejam incluídas por lei entre os profissionais que podem contribuir com anotações no prontuário médico: “O Ministério da Saúde reconhece nosso papel na realização de partos humanizados e nós já registramos informações em nossas observações. Seria importante formalizar essa prática”.
Também participaram da audiência a representante da Comissão de Saúde do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (Cedim), Fátima Cidade; a diretora executiva do Espaço Gaia, de São Gonçalo, Laura Torres; a presidente do coletivo Axé em Luta, Ariane Magalhães, que também faz parte do grupo Justiça por Taysa; além de outros representantes de grupos da sociedade civil organizada.
Entre outras questões pontuadas na reunião foi destacada a necessidade de os estabelecimentos de saúde armazenarem por tempo indeterminado os prontuários em caso de ação judicial sobre o atendimento, o que já está previsto na Lei 13.787/18.
Fonte: Alerj