
Foto/Divulgação: Alex Ramos e Thiago Lontra
O Estado do Rio poderá ter um novo Código de Direito dos Animais. Com mais de 55 artigos e 19 capítulos, a normativa visa atualizar e substituir o antigo código, que é de 2002. A medida consta no Projeto de Lei 4.120/24, de autoria original dos deputados Luiz Paulo (PSD) e Carlos Minc (PSB), que foi aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) nesta quinta-feira (08/05), em primeira discussão. A medida ainda precisa passar por uma segunda votação na Casa.
O novo código reconhece os animais como seres conscientes e sencientes, portanto passíveis de sofrimento e dotados de dignidade própria. De acordo com a proposta, compete ao poder público e à coletividade zelar pelo bem-estar animal e combater a crueldade contra os mesmos, em todas as suas formas, sejam atos comissivos ou omissivos.
A medida elenca mais de 45 tipos de maus tratos e abusos aos animais, entre eles realizar tatuagem e a implantação de piercings, praticar a zoofilia, realizar a caudectomia (amputação do rabo), conchectomia (amputação das orelhas) ou qualquer outra intervenção cirúrgica em animais com fim estético, além de oferecer animais a título de brindes.
O código também proíbe a realização de lutas entre animais da mesma espécie ou de espécies diferentes, touradas, simulacros de tourada, vaquejadas e rinhas. Os animais também não poderão participar de competições ou qualquer tipo de esporte quando forem jovens demais, velhos, enfermos, feridos ou não tiverem condições físicas adequadas. Não será permitida a venda de animais vivos em logradouros públicos e nem promover feiras de filhotes sem que estejam devidamente imunizados com as vacinas tecnicamente recomendadas e apresentação dos documentos comprobatórios.
O descumprimento das normas do código acarretará aos infratores sanções previstas na Lei Estadual 3.467/00 – que dispõe sobre penalidades administrativas por condutas lesivas ao meio ambiente – e na Lei Federal 9.605/98 – que dispõe sobre as sanções penais. As pessoas condenadas por maus-tratos a animais ficam proibidas, após o cumprimento da pena, de ter a guarda de animais domésticos por no mínimo cinco anos. O Governo do Estado poderá instituir canal específico para denúncias relacionadas a abusos contra animais.
Além da regulamentação dos maus tratos e abusos, o projeto conta com diversos regramentos e com capítulos específicos para animais silvestres, animais domiciliados, cães bravos, cães e gatos de rua, animais de uso econômico, animais de transporte e animais de laboratório. A norma ainda determina que o Governo do Estado amplie o atendimento veterinário público e gratuito.
Consultas em universidades e legislações de outros países
A iniciativa revoga o antigo código – Lei 3.900/2002. O deputado Luiz Paulo (PSD) explicou que a lei anterior já tinha sido alterada inúmeras vezes e que estava altamente remendada e com atualizações a serem feitas. Para a elaboração do código houve consultas a pesquisadores e professores, levantamento de artigos e publicações, bem como análise de leis de outros estados e países, incluindo Espanha, Portugal e Estados Unidos.
“Com o passar dos anos, o antigo código ficou absolutamente contraditório, com muitas emendas. Neste período, o mundo também evoluiu no sentido de ter mais proteção e reconhecimento da cidadania do animal. A nova proposta é bastante aperfeiçoada e foi realizada a várias mãos analisando normas do mundo inteiro”, explicou Luiz Paulo.
Outro autor original da norma, o deputado Carlos Minc disse acreditar que o novo código será replicado pelo Brasil inteiro. “Este projeto pune os maus tratos, pune o abandono e determina uma série de condições que estabelecem direitos. Na Alerj já existiam diversas leis sobre o tema, além do código antigo, como a proibição de rinha de galos e a realização de tatuagens e piercings. Nós compilamos tudo neste amplo projeto”, concluiu Minc. Os autores abriram a coautoria para qualquer deputado interessado.
Animais domésticos
A proposta estabelece que os tutores devem manter a carteira de vacinação do animal atualizada. Com relação especificamente aos cães e gatos, os tutores são obrigados a vacinar contra a raiva, observando o período recomendado pelo laboratório para a revacinação. O projeto também proíbe o acorrentamento de animais domésticos e o alojamento dos mesmos somente em varandas ou espaços expostos às intempéries climáticas.
Os petshops, feiras ou criadores que comercializam cães e gatos terão que realizar a identificação eletrônica individual e definitiva implantada nesses animais, através de microchip, por profissional médico veterinário devidamente habilitado. Os municípios poderão instituir políticas públicas voltadas para o cadastramento dos animais domiciliados por meio da microchipagem.
Os cães bravos, como os da raça pit bull, somente poderão circular em logradouros públicos se conduzidos por pessoas maiores de 18 anos através de guias com enforcador e com guia curta e focinheira, que permita a normal respiração e transpiração dos cães. Esses animais não poderão permanecer em praças, jardins, parques públicos e nas proximidades de unidades de ensino públicas e particulares.
Outro tema em voga atualmente na sociedade é o transporte de animais em aeronaves, ônibus e embarcações. Com o intuito de acondicionar os animais que seguirão viagem fora da cabine de passageiros, o novo código estabelece que as empresas responsáveis pelo transporte coletivo de pessoas providenciem a aquisição de câmaras oxigenadas, iluminadas, com conforto térmico, compartimentos de disponibilização de alimentação e água, além de dispositivos ou travas para as caixas de transporte. Essas empresas ainda deverão contar com os serviços de um profissional que responda pelo cumprimento das normas e treinamento das tripulações.
O código ainda proíbe o extermínio de cães e gatos de ruas pelos órgãos de controle de zoonoses, canis públicos e estabelecimentos oficiais congêneres. A eutanásia somente será permitida nos casos de enfermidades em situação de irreversibilidade e deverá ser justificada por laudo do responsável técnico, precedido de exame laboratorial. Os documentos terão que ser acessíveis às entidades de proteção dos animais. O procedimento deverá ser realizado por meio de métodos cientificamente comprovados e humanitariamente aceitáveis, que produzam a cessação da vida animal de forma indolor e digna, garantido sempre a prévia perda da consciência. É obrigatória a participação do médico veterinário na supervisão e/ou execução da eutanásia animal.
Os gatos e cães de rua resgatados pelos órgãos públicos poderão ser recuperados pelos seus antigos donos em até sete dias. Caso ninguém solicite, os animais serão disponibilizados para adoção.
Abatedouros, animais de transportes e de laboratórios
O projeto também tem capítulos específicos para o uso econômico dos animais. Segundo a norma, todo frigorífico, matadouro e abatedouro no Estado do Rio terá que usar métodos científicos e modernos de insensibilização. Já o transporte de veículos ou instrumentos agrícolas e industriais somente poderá ser realizado por cavalos, mulas, bois e búfalos. Os animais que trabalham devem ter o direito à uma adequada limitação do tempo e intensidade do trabalho, à uma boa alimentação, ao repouso e ao atendimento e à assistência médico veterinária com regularidade. Será proibido, por exemplo, fazer o animal viajar a pé por mais de dez quilômetros sem lhe dar descanso.
A norma ainda proíbe a utilização de animais, de quaisquer espécies, em circos, atividades de malabarismo e espetáculos similares, ainda que sejam sem público presente com transmissão pela internet, aplicativos ou outros dispositivos eletrônicos.
Com relação às pesquisas científicas, o código proíbe a utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes. Em outras pesquisas científicas, o número de animais a serem utilizados para a execução de um projeto e o tempo de duração de cada experimento será o mínimo indispensável para produzir o resultado conclusivo, poupando-se, ao máximo, o animal de sofrimento.
Fonte: Alerj