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Uma pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), publicada pela revista científica eLife, de circulação internacional, constatou que o pulmão primitivo dos vertebrados era ímpar, ao contrário do que se acreditava até então. A descoberta revoluciona os estudos sobre evolução, além de poder alterar a definição atual que se tem de pulmão na literatura. O artigo “A evolução do pulmão em vertebrados e a transição para o ambiente terrestre” foi elaborado por uma equipe internacional liderada pela Profa Dra Camila Cupello do Laboratório de Ictiologia Tempo e Espaço, vinculado ao Departamento de Zoologia do Instituto de Biologia Roberto Alcantara Gomes (Ibrag) da Uerj. O objetivo do estudo é entender a evolução pulmonar até chegar aos tetrápodes, grupo de animais com quatro membros locomotores que inclui os seres humanos.

O estudo foi pioneiro ao explorar uma grande quantidade de animais de forma detalhada, o que possibilitou a constatação. “A gente descobriu que o pulmão primitivo é ímpar e que o pulmão par veio depois na evolução, nos grupos que são nossos ancestrais. Então, isso seria importante para entender o processo evolutivo de saída das águas que começou mais ou menos no Devoniano, há mais de 300 milhões de anos atrás. O pulmão par, com mais superfície de contato, conseguiria ser mais útil do que o pulmão ímpar para fazer trocas gasosas aéreas”, explica Camila Cupello, que é Professora Visitante do Departamento de Zoologia da Uerj e Jovem Pesquisadora Fluminense da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).

“A evolução não é linear, não é direcionada. São coisas que acontecem ao acaso. Não estou dizendo que a duplicação do pulmão aconteceu para que os peixes pudessem sair das águas, mas facilitou”, esclarece. De acordo com a pesquisadora, os primeiros grupos de animais que ensaiaram como seria o início da vida terrestre não saíram totalmente do ambiente aquático para respirar. “Os primeiros tetrápodes que fizeram esse processo de saída das águas, provavelmente iam para a beira do lago ou do rio, respiravam e voltavam até que outros grupos surgiram e conseguiram sair totalmente do ambiente aquático e chegar ao que sem tem hoje”, complementa.

A análise foi feita com uma extensa série de peixes pulmonados, sendo utilizada pelo menos uma espécie de cada grupo, e, como modelo para entendimento dos tetrápodes, as salamandras serviram para comparação. A pesquisa não envolveu sacrifício animal e as peças estudadas são de museus científicos e do próprio acervo da Uerj. Como forma de preservar o material, foram feitas tomografias desde o período embrionário dos peixes até o estágio que já executa a respiração aérea. A maioria das imagens foram obtidas por meio do Síncrotron, um acelerador de partículas que faz tomografias de alta qualidade.

O experimento aconteceu em duas etapas: realização de tomografias e reconstrução tridimensional. As tomografias foram realizadas na França e no Japão, no período de uma semana. Já a reconstrução tridimensional foi feita na Uerj, no laboratório montado com o apoio da Faperj. “Na reconstrução tridimensional, segmenta-se a peça e seleciona a área de interesse, gerando modelos 3D, como se estivesse dissecando virtualmente o órgão. Esse processo levou bastante tempo, pois é um trabalho minucioso”, explica.

O Laboratório de Ictiologia Tempo e Espaço, coordenado pelo Professor Titular Paulo Marques Machado Brito, também autor do artigo, realiza pesquisas de base cujo objetivo é contribuir para a expansão do conhecimento.

Segundo a definição que se tinha até o momento, o pulmão seria um órgão ventral par. Com a redefinição sugerida pelo estudo da Uerj, o pulmão passa a ser um órgão de origem ventral e ímpar, mas que pode ter uma posição dorsal. De acordo com Camila Cupello, as descobertas mudarão a visão científica sobre a origem e evolução inicial do pulmão, além de auxiliar no entendimento sobre a adaptação dos tetrápodes ancestrais à vida terrestre.

“É provável que a novidade evolutiva da natureza pareada do pulmão tenha permitido a adaptação completa à respiração aérea. A ciência pura possibilita a proposição de novos conceitos e a atualização de livros, mesmo que sejam do Ensino Médio, e esse pode ser o principal benefício do nosso estudo para o público em geral”, finaliza a pesquisadora.

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